22 de novembro de 2009

O casamento gay é um gueto

Escreve o psiquiatra Daniel Sampaio na revista Pública de hoje:
"Em termos simples, a nossa lei impede a consagração do amor entre dois homens ou duas mulheres: para mim, estamos a cercear direitos humanos e a aumentar a discriminação. (...) Nada é mais importante do que o combate à discriminação; nada é mais urgente do que a luta pelos direitos humanos. Nenhuma sociedade democrática se pode considerar avançada enquanto muitos dos seus membros estiverem impedidos de consagrar o seu amor aos olhos de todos nós."
No fundamental, o texto reafirma o apoio de Daniel Sampaio ao casamento gay e rejeita
a hipótese de referendo sobre o tema (abaixo, texto original).

aqui se demonstrou que todos os tratados de referência sobre direitos humanos se referem ao casamento como uma instituição heterossexual. E não seria sério dizer que esses tratados estão todos errados. Que o psiquiatra pense que casar é um "direito humano", é portanto uma opinião como outra qualquer.

O grave não está aí. Está na ideia de "consag
ração do amor" homossexual através do casamento. "Consagrar" significa tornar sagrado, puro, inviolável. Remete para o casamento como sacramento religioso. Aliás, "sacramentar" e "consagrar" são sinónimos. Tratando-se do texto de um psiquiatra, é legítimo pesar bem o peso das suas palavras e acreditar que se escolheu aquelas palavras é porque queria aquelas e não outras.

I
nterpretadas de boa-fé, as palavras de Daniel Sampaio equivalem a dizer que:

- só o amor entre casados é puro e inviolável;

- que antes de a ideia do casamento gay ser plantada na esfera pública os homossexuais não se sentiam legitimados nos seus sentimentos amorosos;


- que hoje, em Portugal, os gays e as lésbicas se sentem menorizados nos seus sentimentos amorosos (logo, todos os que têm relações estáveis querem casar-se);

- que países como Inglaterra, França, Alemanha,
Noruega, Dinamarca ou Finlândia não são "sociedades democráticas avançadas" (são países onde não existe casamento entre pessoas do mesmo sexo).

É absurda a ideia de que o casamento gay é uma causa vanguardista. Como pode ser vanguardista a defesa de um modelo de conjugalidade decadante, que subjuga
as mulheres e impõe uma norma heterossexista à sociedade?

É absurda a ideia de que só quando o casamento f
or alargado a homossexuais é que passa a haver relações amorosas legítimas entre homossexuais. E as relações gay actuais são o quê, ilegítimas?

O que está a funcionar no texto de Sampaio é a lógica heterossexista. Os normais e os outros: os amantizados, os amancebados, os concubinos.
O casamento como gueto da normalidade. Não há melhor forma de provar que a rejeição do casamento gay faz todo o sentido.


1 comentário:

  1. Caro Bruno, aconselho a leitura de arno gruen. Parece-me querer impor uma normalidade tambem

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