6 de novembro de 2009

Os seis dogmas

Uma parte do activismo gay tem conseguido infestar a opinião pública portuguesa com poderosos argumentos a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo, beneficiando em grande medida da conjuntura internacional favorável ao tema.

Através de livros, debates, manifestações de rua, textos de opinião nos jornais e em blogues, sessões públicas, petições na Internet, festas populares e manipulação mediática, seis dogmas nasceram. São uma espécie de “não discutimos a família e a sua moral”, mas ao contrário. A saber:

1) o casamento gay é uma questão de direitos humanos, só pode ser discutida no plano jurídico e qualquer outra designação, que não casamento, para a união entre homossexuais é uma afronta aos direitos dos homossexuais;

2) o casamento gay não é referendável, porque os direitos das minorias não podem ser decididos pelas maiorias;

3) todos os homossexuais são a favor do casamento entre homossexuais;

4) os argumentos contra o casamento gay só podem ser ou conservadores ou discriminatórios;

5) impedir os homossexuais de casar é um atentado ao artigo 13º da Constituição Portuguesa, que determina que ninguém possa ser discriminado em função da orientação sexual;

6) os homossexuais passam a ser vistos como cidadãos de pleno direito se o casamento lhes for concedido, contribuindo-se assim para o fim da homofobia na sociedade portuguesa.

Todos os seis dogmas são abusivos e estão errados. Têm, no entanto, feito escola, sem escrutínio ou contraditório. Para os sustentar, os partidários do casamento gay escudam-se num debate essencialmente legalista, onde só a argumentação jurídica importa e do qual estaria alegadamente ausente qualquer componente ideológica.

No entender destes activistas, só os adversários do casamento é que teriam uma agenda ideológica escondida e homofóbica. Eles, os defensores, estariam apenas do lado da razão, a lutar por um direito natural, sem manipulação ou jogo.

Não é verdade. Os advogados do casamento homossexual, ao situarem o debate na esfera legalista estão a empurrar os adversários para um campo altamente minado e carregado de ideologia.

A principal armadilha que importa desmontar é a de que o casamento gay é uma questão de direitos humanos, apenas discutível no plano jurídico. O casamento gay é uma questão eminentemente ideológica, ainda que para ser operacionalizada careça de uma alteração à lei.

O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é uma ideologia que está na moda. Um produto de consumo das sociedades democráticas Ocidentais. Defendido por um movimento gay amansado. Apoiado por forças políticas centristas que precisam de conquistar o voto do eleitorado de esquerda ou por forças de esquerda cujo eleitorado impõe a defesa de causas fracturantes.

O casamento civil entre pessoas do mesmo sexo é a estocada final da normalização sexual. Como classifica o escritor espanhol Álvaro Pombo, no romance Contra-Natura (2009), o conjugalidade gay decalcada da conjugalidade heterossexual padrão é apenas uma “imersão deliberada na normalização burguesa”, uma “vida beata”, “uma homossexualidade jurídico-política”, uma “homossexualidade normalizada, doméstica, conjugal”. Uma homossexualidade domesticada.

Estar contra o casamento gay não é ser conservador, católico acéfalo ou extremista de direita. Quem recusa os preconceitos segundo os quais as relações entre lésbicas e entre gays são incorrectas, anti-naturais ou menos importantes do que as relações entre pessoas de sexo diferente, também pode rejeitar o casamento gay. Uma rejeição que passa não apenas pela objecção de consciência perante a possibilidade legal consumada, mas também pela contestação antecipada dessa possibilidade.

Não se tresleia, pois, este blogue à procura de homofobia. Ela manda dizer que não está.

2 comentários:

  1. Como costumo fazer para mim próprio quando tenho dúvidas, sugiro o seguinte exercício: transpôr o conteúdo para outra esfera, para poder julgar da admissibilidade do raciocínio.
    Eis um exemplo do resultado:
    "Uma parte do activismo cigano tem conseguido infestar a opinião pública portuguesa com poderosos argumentos a favor do casamento entre ciganos, beneficiando em grande medida da conjuntura internacional favorável ao tema." (...) "Quem recusa os preconceitos segundo os quais as relações entre ciganos são incorrectas, anti-naturais ou menos importantes do que as relações entre pessoas de raça branca, também pode rejeitar o casamento cigano."
    A homofobia não está presente? Será outra coisa?

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  2. concordo com os teus dogmas todos!

    1) Sim. Prefiro Vrenhiec. E prefiro dicutir o casamento nos planos ortográfico e gramatical, faz muito mais sentido. Por exemplo, o casamento é gay, eu sou vivaço, tu és triste.

    2) Claro que é referendável! Tudo é referendável. É claro que é também referendável o teu direito a aparar a barba, afinal as pessoas com óculos não veem bem e podes-te cortar.

    3) Infelizmente, muitos não gostam de si o suficiente para acharem que merecem o mesmo que todos os outros. Outros com a coisa da pós-modernidade acham que por não quereram para si, e esquecem o facto de poderem escolher lhes dá, de facto, o único poder de dizer realmente "não quero para mim. posso escolher, e escolho não".

    4) Alguns são apenas estúpidos.

    5) Não, impedir o acesso ao casamento sublinha, evidentemente, a igualdade. É tão simples perceber isto. Eu não caso, tu não casas, eles casam todos.

    6) Maricas e fufas a casarem-se vai fazer caír o mundo. O ódio de tanto casório súbito vai ser tanto que vamos todos ser ainda mais odiados pelas famílias e amigos e conhecidos. Que maçada.

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