12 de novembro de 2009

O casamento gay como conceito anacrónico

Excerto de notícia publicada ontem no Público:

"[A] tendência que sobressai nas estatísticas do INE é que o casamento, com ou sem coabitação prévia, continua a perder terreno. Em 2008, houve 43.228 casamentos, ou seja, menos 3101 do que em 2007. Querem estes números dizer que a taxa bruta de nupcialidade baixou para 4,1 casamentos por mil habitantes - o valor mais baixo desde 1900.

[A socióloga] Anália Torres olha para estes números, conjuga-os com o aumento dos divórcios (26.885 em 2008, mais 1474 do que em 2007), mas conclui que isso está muito longe de significar a falência da conjugalidade. "A vida em casal continua a ser muito valorizada, se calhar até demais, no sentido em que as pessoas depositam nela demasiadas expectativas. O que está a perder terreno é a dimensão institucional, a ideia do casamento enquanto amarra para a vida inteira."

[notícia original aqui]

6 comentários:

  1. A notícia não permite inferir que o "casamento gay" é anacrónico, pois que não existe na nossa sociedade. Talvez o casamento tout court esteja a tornar-se anacrónico, sem dúvida. Mas isso não teria sido razão para se impedirem 86.456 pessoas de optar pelo casamento, em 2008. E se houve 26.885 divórcios em 2008, envolvendo 53.770 pessoas, isso só prova que o casamento entre heterossexuais não é uma instituição muito estável. O que faz cair por terra o argumento que já foi utilizado algumas vezes contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, segundo o qual as suas relações seriam menos estáveis do que as dos heterossexuais... mas de qualquer forma estes argumentos são estéreis, é como discutir o sexo dos anjos quando os Turcos estavam às portas de Constantinopla. Neste caso é a Igreja e as associações de defesa "da vida" ou "da família" que querem através de um possível referendo não apenas ilegitimar o casamento entre homossexuais, mas a própria homossexualidade! E neste estado de coisas, não devemos andar a degladiar-nos, mas devemos sim lutar em conjunto contra a vitória da homofobia, quer sejamos ou não a favor do "casamento"!!!

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  2. Jorge: não são argumentos estéreis se se pensar que um das ideias principais que tenho defendido neste blogue é a de que os defensores do casamento gay deveriam era defender que os benefícios de que gozam hoje os casados se estendam a todas as realidades familiares e afectivas, independentemente do número de pessoas ou do estado civil. Justamente porque o casamento está crise e é uma realidade de outro tempo.

    Já agora, não é verdade que a igreja católica defenda o referendo ao casamento gay: http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1417601

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  3. Então porque intitula o blogue "Contra o casamento gay"? Porque não fez um blogue intitulado "Extensão dos benefícios de que gozam hoje os casados a todas as realidades familiares e afectivas, independentemente do número de pessoas ou do estado civil"? Qual é, afinal, o seu objectivo? Se considera o casamento obsoleto porque não ataca o casamento convencional? Porque razão não aceita que as outras pessoas, ainda que sejam minoria, tenham o direito de decidir por si mesmas o que lhes convém?

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  4. Oh bruno, agora explica-me como se eu tivesse 4 anos de idade... Eu sei que o casamento como é visto na sociedade portuguesa (que é o que está em causa) está em declínio, perante todos os estudos - valham o que estes valham... Sei também que, sendo gay, não me dá a mínima vontade de casar, porque simplesmente não acredito na instituição do casamento.

    A minha dúvida é porque é que, tu sendo um gajo inteligente como és, fazes um blog contra o casamento gay.

    Ou seja, porque é que achas tão essencial (achas mesmo?) que não haja casamento gay, no que é que issso vai interferir na tua vida directamente? Não achas que é simplesmente melhor que o código civil permita que tal aconteça, usufruas tu ou não do dito cujo?

    Acho mau que sejamos contra simplesmente porque achamos que não é consensual mesmo entre os homossexuais portugueses... Eu não preciso de ter que usar uma lei para achar que ela é justa, certo?

    É na base do "hey, és contra o casamento, então não cases!"... Ou "és a favor do casamento, achas que te serve, então casa!". Porquê ser contra?
    Porquê ser anti?

    Não percebo isso, por muitos indicadores sociais que me apresentes. Porque sim, existem liberdades que são alheias à vontade da sociedade civil por serem pessoais.

    Porque é que te achas no direito de negar tais liberdades a amigos teus?

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  5. Anónimo: não estou a negar direitos a ninguém. Escrevi noutro 'post': "que os homossexuais têm que ter os mesmos direitos de que beneficiam, hoje e de futuro, os casais heterossexuais casados, ninguém duvida."

    Estou contra o casamento gay, embora saiba que a probabilidade de ele ser aprovado é altíssima.

    Não é verdade que a existência do casamento gay não interfira com a vida de quem não se quer casar.

    O casamento hoje já interfere com a vida de quem não se casa, porque implica a existência de uma norma. Quem foge à norma (quem não se casa) é visto como tendo uma vida sexual e sentimental anormal.

    O casamento gay, ao criar uma norma de comportamento conjugal (ou melhor, ao alargar aos gays a norma que os heterossexuais hoje têm), cria necessariamente marginalidades, socialmente reprovadas.

    O casamento gay vai aprisionar a homossexualidade num conjunto de práticas conjugais e afectivas que criam um grupo de cumpridores e outro de dissidentes.

    Ou seja, o casamento gay cria desigualdades simbólicas num mundo, o da homossexualidade, onde hoje há uma igualdade comum (só variando, infelizmente, em função da classe social).

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  6. O casamento não interfere minimamente na minha vida porque não sinto necessidade de me integrar numa "norma", ou seja, não sinto necessidade de ser "normal" - o que é que é isso mesmo? "Normal" é o que a sociedade dita?

    Não, bruno, continuo a achar que, se o casamento gay cria "desigualdades simbólicas", as que ele destrói têm muito mais valor- nem que seja pela visibilidade que se dá.

    De novo, não sinto vontade de me casar. Mas o que não sinto mesmo é necessidade de ter uma vida que se rege pelo que os outros pensam.

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